domingo, 24 de agosto de 2008

'A paz é a gente que faz'

Por Edgel Teles

Ano eleitoral e inúmeras promessas de um ‘Brasil melhor’. Na TV, partidos políticos defendem ações de toda estirpe: das mais repetidas às impraticáveis, sob a legenda do bem-estar social. Com as promessas feitas pelo crescente número de pretendentes a uma vaga nas famigeradas assembléias e câmaras, aumenta, também, a esperança do povo. A ilusão do direito à educação, saúde e habitação contrasta com a boa vontade, apresentada durante as eleições, daqueles que se dizem donos do poder. Mas quando os direitos não vêm, e eles pouco vêm, é dever dos votantes cobrar dos votados.

Os insistentes apelos que a população faz ao governo público têm a conquista da paz como objetivo. Entretanto, parece que estamos longe disso, como mostram estatísticas que mais parecem manchetes: 12% das 55, 6 milhões de crianças brasileiras menores de 14 anos são vítimas anualmente de alguma forma de violência doméstica; 18 mil crianças são vitimizadas por dia e 12 crianças são agredidas por minuto. (Fonte: Sociedade Internacional de Prevenção ao Abuso e Negligência na Infância).

Muitos afirmam que esses números tão chocantes são resultado de políticas públicas ineficazes e insatisfatórias. Agredir um filho, porém, não é prática dos pais menos favorecidos, já os dados citados acima abrangem famílias de todas as classes sociais. É contraditório, portanto, cobrar um ‘Brasil melhor’ quando, dentro de casa, não há respeito entre pai e filho.

A alegada consangüinidade deixa parentes e vítimas inertes. Os maus tratos, que vão de ‘chineladas’ a abusos sexuais, não são denunciados junto aos Conselhos Tutelares e às Delegacias de Proteção à Criança e ao Adolescente. Assim, um dos principais motivos para a impunidade do crime é a falta de coragem.

Deve-se ressaltar que os casos de violência doméstica são pouco denunciados pela mídia.
Há entre os meios de comunicação uma espécie de tabu diante dos casos de incesto no país. Segundo pesquisas realizadas pela Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi), apenas 21,7% dos casos de abuso por parte dos pais são veiculados pela imprensa. Além disso, a palavra 'incesto' pouco aparece nos textos, prejudicando uma visão mais precisa do crime por parte dos leitores, que acabam por desconhecer as causas desse tipo de violência, bem como agir caso estejam em situação parecida. E a informação vem incompleta porque a cobertura é feita priorizando o ato violento em detrimento do fenômeno social.

Exigências por um futuro mais justo de pouco adiantam quando não há uma contribuição geral pela promoção da paz. Devemos aliar campanhas de conscientização, políticas governamentais, auxílio de ONGs e penas legais mais severas ao conceito simples de cidadania. A luta por direitos sociais só poderá ser feita plenamente em uma sociedade na qual os pais respeitam a integridade física e moral dos filhos.

Veja a carta que a apresentadora Xuxa escreveu sobre pais que maltratam os filhos: - Ela está à frente da campanha 'Não bata, eduque!', apoiada pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Unesco e Andi - (http://www.naobataeduque.org.br/home/index.php)

Quantas Isabellas vamos perder até entendermos que violência e educação não combinam?
Será que não é o momento de as pessoas perguntarem se realmente educar é bater? Se precisa bater para educar?

Será que é necessário agredir, machucar, tirar sangue de uma criança, para educá-la? Ser o “responsável”, dá direito a bater na criança, com a frágil desculpa de que se está educando?!!!! Assim como outros comportamentos absurdos foram mudados (a escravidão; bater em mulher), está na hora de mudar essa “cultura” de que o pai, a mãe ou o responsável têm o direito de bater em uma criança, para educá-la.

A violência dentro de casa pode começar num olhar raivoso, berros, um tapinha, um empurrão, um beliscão até chegar à tragédia de atirar uma criança pela janela.

É nesse mundo violento que queremos viver? Até quando? O pensamento de algumas pessoas é que, “como eu apanhei quando crianças e estou aqui” - dizem alguns com orgulho - “vou repetir a fórmula, também baterei em meus filhos para ‘educá-los’”. Ou: “Assim ele vai aprender mais rápido, basta eu falar uma só vez e serei obedecido, ele vai saber quem manda aqui”. Minha vontade é gritar : “Quem deu esse direito aos adultos?” E por que algumas pessoas continuam acreditando nisso? Esse “direito”de adulto bater em criança deveria ser cassado. É absurdo! É animal! É irracional! Até os animais protegem os seus filhotes. Por que alguns seres humanos, racionais, não protegem os filhotes da nossa espécie?

É um assunto que tem que ser levado a sério. Temos que trazer este tema para o debate nacional. Criança não é “coisa” , é pessoa, e como pessoa e cidadã, precisa ser respeitada e protegida, precisa ser vista como prioridade, prioridade absoluta.

Há alguns anos, os maridos batiam nas mulheres sem que nada acontecesse. Era ‘normal’. Hoje, é crime bater numa mulher. Há pouco mais de um século, um ser humano podia ser dono de outro ser humano. A tragédia de Isabella causou comoção nacional, ganhou todas as manchetes de jornais, televisão, rádio, internet. Muitas outras histórias trágicas acontecem todos os dias por aí e nem ficamos sabendo. São invisíveis? Neste Brasil tão grande, quantas Isabellas já foram vítimas de violência e as pessoas não sabem?

Até quando vamos nos comover, falar no assunto durante dias, e depois continuar sabendo que situações como essas continuam acontecendo, “invisíveis”, até que uma outra manchete de jornal nos deixe indignados? Quantos pais, mães, responsáveis com raiva por situações de trabalho, ou por falta dele, com uma fechada no trânsito , brigas com namorado(a), marido( mulher), estressados com o dia-a-dia descontam nos filhos? E vão continuar descontando enquanto essa violência invisível não for recebida por toda a sociedade como crime.

Quando uma criança bate em outra, os pais dizem para não bater porque é falta de educação, é violência e tem que conversar com o amiguinho...Mas, como pai e como mãe, podem bater e dizer que é para educar??????? Como pode uma criança se defender de uma pessoa com o dobro do seu tamanho? Como se proteger e se defender daqueles que lhe deram a vida e, teoricamente, deveriam protegê-la?

Por que nossas crianças estão aprendendo dentro de casa o que é violência enquanto deveriam estar aprendendo o verdadeiro significado do amor? Quando ouvimos uma criança pedindo socorro ou sendo agredida por seus pais temos que cruzar os braços? Precisamos proteger nossas crianças com uma lei. Vamos gritar juntos! Violência de pai, mãe e responsáveis contra criança não é educação, é crime!"

No Criança Esperança, Xuxa canta a música a seguir. Tudo pelo combate à violência doméstica:

As nossas mãos
Tem o poder
De dar carinho
Em vez de dor
Tente entender
Pra que bater?
Toda criança
Tem direito ao amor

Vamos cantar
Eu quero Paz
Eu quero Paz
Uma só voz
Eu quero Paz
A Paz a gente é que faz
Vamos plantar
O Grão da paz
Pro mundo todo então colher
É pra lembrar que a Paz
Só pra dizer que a Paz
É a gente que faz

[crianças falam]
*Eu não gosto de sentir dor e fome
*Eu quero crecer sendo cuidado com muito carinho, amor e proteção
*Eu quero viver em segurança num mundo de paz
*Nehuma criança pode trabalhar eu quero ir pra escola estudar
*Eu quero saúde e alimento pra crescer forte e brincar
*Eu tenho medo de armas, eu não aceito nenhuma violência

> No Criança Esperança 2008, a Rainha dos Baixinhos canta a música na linguagem dos surdos. Confira o vídeo no Youtube - http://br.youtube.com/watch?v=x7Ruj0qF_0o

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